Queimadas no Pantanal: um quadro geral

Sobre o Bioma Pantanal

O Pantanal, um dos mais ricos biomas do Brasil, com diversas espécies de fauna e flora, possui cerca de 210 mil km², sendo que apenas 4,4% de sua área total é protegida com unidades de conservação, segundo dados do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Neste ano, o bioma está passando por uma das maiores queimadas de sua história. De acordo com o Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais (Prevfogo), 15% do seu território total foi devastado pelas chamas em 2020. 

As queimadas no Pantanal não são inéditas e muitas vezes ocorrem naturalmente devido ao clima da região que em determinadas épocas do ano fica muito quente e seco. Contudo, indícios sugerem que as queimadas no Pantanal têm sido, em sua maioria, provocadas pela ação humana, como demonstram perícias que o Centro Integrado Multiagências de Coordenação Operacional (Ciman) conduziu utilizando imagens de satélite para identificação da origem dos incêndios. Modificações da cobertura vegetal e do ciclo hídrico, que deixam o clima da região mais seco, têm ocorrido com o avanço da fronteira agrícola – principalmente para o plantio de soja. Foi estimado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), que 16,5% da vegetação original do Pantanal fora desmatada para que fossem abertos novos espaços para plantio. Além disso, dados divulgados pelo Instituto em setembro, indicam que em comparação com o mesmo período de 2019, a região teve 210% de aumento de incêndios e mais de 14.000 focos de calor nesse ano, com um pouco mais de 4.000 focos no ano passado. 

Ações do Governo Federal

Apesar do claro problema ambiental enfrentado, percebe-se uma redução no número de fiscalizações, tendo o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) reduzido sua atuação em regiões de grande incidência de focos como os estados do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. As razões para isso, segundo relatado por servidores do IBAMA à BBC Brasil News, envolvem redução no contingente de fiscais, nomeação aos cargos de gestão do órgão por pessoas sem experiência na área e criação de novas rotinas administrativas. 

Para muitos especialistas, as ações tomadas pelo governo federal têm sido insatisfatórias. Segundo Suely Araújo, especialista sênior em políticas públicas do Observatório do Clima e ex-presidente do IBAMA, em uma reportagem para a BBC Brasil News, o trabalho dos fiscais passou a ser questionado em discursos do próprio presidente Jair Bolsonaro, do Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, e de outras autoridades do governo, o que acabou por criar um incentivo a mais para quem quer cometer crimes ambientais.

Esse discurso, porém, não é novo, uma vez que já na campanha eleitoral de 2018, Bolsonaro defendia a ideia de que os agentes do IBAMA e ICMBio, além de outras autarquias ambientais, agiam com um rigor muito grande nas fiscalizações, sendo injustos, por exemplo, com agricultores, garimpeiros e madeireiros. 

Contudo, no mês passado, depois de visitarem a região, o Presidente e o Ministro Ricardo Salles, reconheceram a gravidade das queimadas, tendo Salles, inclusive, postado em sua conta no Twitter, no dia 13 de setembro, um post sobre a quantidade de ajuda enviada ao Pantanal (aviões, helicópteros, viaturas, brigadistas, bombeiros e voluntários), evidenciando a atuação do governo na região.  

Conclusão 

Cabe ressaltar, todavia, que essas movimentações do governo federal só vieram após forte pressão de diversos grupos empresariais do agronegócio e autoridades estrangeiras no campo ambiental. Um exemplo foi a carta endereçada ao Presidente da República e diversas outras autoridades que pedia por medidas urgentes de combate ao desmatamento, assinada pela Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, que reúne mais de duzentas organizações, entre ONGs, institutos de pesquisa e grandes empresas relacionadas ao agronegócio. Esse movimento reflete uma preocupação crescente entre empresas de alguma forma relacionadas ao agro, ou mesmo que apenas façam negócios no Brasil, uma vez que a política federal em relação ao meio ambiente tem desgastado fortemente a imagem do país, afastando tanto investidores, quanto clientes.

Principalmente na Europa, onde a questão ambiental tem fortes impactos políticos, a inércia governamental brasileira tem gerado fortes respostas. Não apenas grupos civis têm levantado campanhas contra o presidente Bolsonaro e produtos brasileiros que tenham elevado impacto ambiental, como políticos influentes tomaram ou fortaleceram posições contra o governo brasileiro. Isso não apenas contribuiu para diminuir o fluxo de investimentos direcionados ao país, como ameaça a ratificação do recém assinado acordo Mercosul-União Europeia, que foi tido como grande vitória da administração atual.

Dessa forma, a política de flexibilização do governo que busca justamente atrair investimentos, mesmo que às custas da proteção ao meio ambiente, acaba tendo um efeito reverso. Fica claro que a visão de que proteção ambiental e crescimento econômico são opostos é tida como ultrapassada por grande parte do setor produtivo, e derrubar floresta não significa aumentar o PIB. 

Escrito por Luis Adriano e Sílvia Suassuna.

Referências:

ILHÉU, Taís. Pantanal em chamas: como é o bioma e como ele é cobrado nas provas. Guia do Estudante, 2020. Disponível em: <https://guiadoestudante.abril.com.br/estudo/pantanal-em-chamas-como-o-bioma-e-como-ele-e-cobrado-nas-provas/>. Acesso em: 05 de out. de 2020.

SHALDERS, André. Queimadas no Pantanal: multas do Ibama despencam apesar de recorde de incêndios. BBC, Brasília, 16 de set. de 2020. Disponível em: <https://www.bbc.com/portuguese/brasil-54159499>. Acesso em: 05 de out. de 2020.

O Pantanal queima no Brasil, e o governo não faz nada. NSC, Nova York, 11 de set. de 2020. Disponível em: <https://www.nsctotal.com.br/noticias/o-pantanal-queima-no-brasil-e-o-governo-nao-faz-nada>. Acesso em: 05 de out. de 2020.

VESSONI, Eduardo. PANTANAL EM CHAMAS. UOL, 2020. Disponível em: <https://www.uol.com.br/nossa/reportagens-especiais/pantanal-em-chamas-a-luta-para-salvar-das-cinzas-a-natureza-e-o-turismo/#page25>. Acesso em: 05 de out. de 2020.

RIVEIRA, Carolina. Mais de 200 empresas e ONGs enviam carta a Bolsonaro, Mourão e europeus. EXAME, 2020. Disponível em: <https://exame.com/brasil/mais-de-200-empresas-e-ongs-enviam-carta-a-bolsonaro-mourao-e-europeus/>. Acesso em: 05 de out. de 2020.

https://g1.globo.com/politica/noticia/2020/09/22/problemas-ambientais-podem-se-agravar-se-acordo-mercosul-ue-nao-entrar-em-vigor-diz-governo.ghtml

GOMES, Pedro Henrique e MAZUI, Guilherme. Problemas ambientais podem se ‘agravar’ se acordo Mercosul-UE não entrar em vigor, diz governo. G1, Brasília, 22 de set. de 2020. Disponível em: <https://g1.globo.com/politica/noticia/2020/09/22/problemas-ambientais-podem-se-agravar-se-acordo-mercosul-ue-nao-entrar-em-vigor-diz-governo.ghtml>. Acesso em: 05 de out. de 2020.

Brasil cita protecionismo e rebate críticas da França ao acordo Mercosul-UE. UOL, São Paulo, 22 de set. de 2020. Disponível em: <https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2020/09/22/brasil-cita-protecionismo-e-rebate-criticas-da-franca-ao-acordo-mercosul-ue.htm>. Acesso em: 05 de out. de 2020.

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